segunda-feira, 19 de abril de 2010

Caso: Estado x Povo*

Quando Thomas Hobbes nos trouxe a idéia da necessidade do Estado, para garantir a segurança dos indivíduos, certamente essa segurança arquitetava-se a uma discricionariedade por parte do governante, visto sua visão absolutista. A sua contribuição face a inauguração do Estado Moderno é indiscutível. No entanto, nos dias de hoje, vemos que a segurança, que seria o argumento maior para o fundamento de toda a sua teoria, não aparece com o mesmo foco, por aqueles que assumiram as rédeas do comando estatal. O Estado a todo momento parece ignorar aquilo que todos vemos claramente ao sairmos de casa, ao lermos o jornal, ou ao ligarmos a TV. Cada vez mais o Estado prioriza seu foco na economia, cultura, lazer e menos se preocupa em resolver aquele que seria o motivo pelo qual justificou um dia a sua criação – a tutela da segurança.

Antes, em um Estado Absolutista, o indivíduo ainda podia, mediante autorização do rei, resolver seus conflitos pessoalmente, fazer a sua própria justiça. Fosse ela boa ou ruim para ele, pelo menos podia contentar-se em saber que algo de concreto foi feito, e o problema resolvia-se rapidamente. Hoje, totalmente dependentes que somos da ação do Estado, visto que apenas ele detém o monopólio do emprego da força, vemos ao mesmo tempo que, dependendo dos envolvidos, o crime parece ser encarado por ângulos diferentes. Quanto maior o poder aquisitivo dos envolvidos, mais atenuantes parecem querer fazer parte do caso. Contrário aos menos afortunados, que ao se verem envolvidos em algo minimamente comprometedor, muito precisam provar para permanecerem como cidadãos de bem.

O Estado insiste em querer governar para os “sadios”, pelo menos quando o assunto é responsabilidade penal. No entanto, não pode esquecer que quando da aplicação da pena, ao retirar o elemento do convívio da sociedade para o devido cumprimento da sentença, o Estado automaticamente se torna responsável pela integridade do indivíduo sob sua tutela, pela efetividade de quando da propositura de mecanismos capazes de proporcionar a socialização desse indivíduo que ali se encontra, e com o retorno desse indivíduo ao núcleo social.

O circuito que inicia-se com a determinação da sentença até a concessão da liberdade, pós cumprimento de pena, é de responsabilidade do Estado. E cada vez mais o Brasil está sucumbindo quando desse trajeto, visto as estatísticas, e situação prisional vergonhosa em que o país se encontra.

A Declaração Universal de Direitos Humanos e o Pacto São José da Costa Rica são exemplos de compromissos firmados pelo Brasil, e que são ignorados quando relacionados a aplicação dos mesmos para com a população carcerária. Algo como se a população carcerária não fosse constituída de elementos, que como qualquer um de nós encontrava-se aqui “do lado de fora”. Não adianta querer isolar um doente do convívio da sociedade, e não tratá-lo quando de sua internação, pois, com certeza ao sair, ele não só poderá ainda estar doente, como que ainda mais comprometido com a sua saúde. O país precisa focar em uma política prisional. O Estado não pode simplesmente querer depois de um tempo devolver a sociedade alguém em condições piores do que quando foi preso. A ressocialização é sim possível, e mais uma vez as estatísticas comprovam isso. Enquanto dados do Conselho Nacional de Política Criminal (CNPC) mostram reincidência criminal em torno de 70%, EUA e a Europa possuem uma taxa de 16%. E aqui, bem próximos de nós, países de realidades não muito diferente da nossa, como Chile, Argentina e Uruguai apresentam taxas inferiores a 25%.

“O sistema prisional brasileiro está próximo da falência total...Os casos que são ventilados pela imprensa envergonham o país. São crimes do Estado contra o povo.” - lamentou o ministro Cezar Peluso, que assumirá em 23 de abril de 2010, a presidência do STF, em entrevista durante o 12º Congresso sobre Prevenção ao Crime e Justiça Criminal da Organização das Nações Unidas, realizado em Salvador. E essa conta quem continua pagando somos todos nós.

Bibliografia:

Jornal O Globo – O País, sábado, 17 de abril de 2010.


* Por Alexandre da Silva Teixeira, criminólogo, articulista, bacharelando em Direito - Niterói/RJ.

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