quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Políticos, mídia e o fenômeno criminal no Brasil

I. Noções preliminares

Nada mais óbvio do que a constatação de que a sociedade brasileira encontra-se, cada vez mais, à mercê da sorte traçada por um rumo que se direciona ao colapso, sobretudo no que diz respeito à crescente e alarmante escalada da criminalidade. Como era a sua vida há 20 anos atrás? A discussão que se apresenta parte do pressuposto de que o controle da criminalidade tem por base o planejamento e a execução de políticas públicas efetivas e a necessária adesão da sociedade àquelas respectivas medidas, que, por sua vez, devem ser implementadas pela formação da opinião pública originária dos meios de comunicação de massa.

II. Políticos X política criminal

Com vistas ao controle do terror que aflige toda estrutura social, os políticos têm decidido por executar algumas medidas, que há muito já se mostraram anacrônicas e inadequadas, visando, inclusive, agradar a opinião pública conduzida e manipulada pela mídia e pelas entidades não-governamentais, fundadas com objetivos ligados à implementação do “combate ao crime” e da “pacificação social”. Note-se que se tem buscado convencer a população - se já não convenceram - de que a progressiva escalada da criminalidade é causada pelas drogas, pelas “diminutas” penas etc. Tudo levando a crer que a opinião desses respeitáveis “políticos”, “jornalistas” e “pacifistas” é permeada pela certeza de que o castigo “brando” e os instrumentos e produtos criminosos é que determinam a prática do crime. Certamente, conceber desta forma seria subestimar demais a capacidade e o intelecto daqueles obstinados. A democracia que vige no Brasil é mantida de forma viciada, pois, inevitavelmente, a classe dos políticos (na sua aparente maioria) estaria em crise se o povo fosse mais consciente de suas responsabilidades e de seu valor para com o Estado. Como falar em democracia se são sempre os mesmos distintos senhores que ocupam as posições de poder, mudando só de cargo como se as eleições fossem apenas uma “dança das cadeiras” ao som das marchas das campanhas milionárias? Ora, sem falar do baixo nível de instrução, o povo brasileiro sempre deixou-se manipular por promessas milagrosas e opiniões totalmente desprovidas de legitimidade - ao menos no que concerne à prevenção criminal. Tudo em prol da conquista e da manutenção do poder, dos cargos e dos favorecimentos de toda ordem, na utilização oportuna e conveniente de algumas das principais mazelas sociais brasileiras: a ignorância do povo, a falta de discernimento político e, até mesmo, pela deficiência de memória e amor. Os “manipuladores” (comunicadores) e os “interessados” (políticos) conhecem bem a questão criminal, mas sabem que, no curto período do mandato político, não se conseguirá diminuir, sequer eliminar, um problema tão complexo como o da criminalidade; muito menos gostariam os titulares de deixar "de mão beijada" um projeto viável e eficiente, iniciado para o seu provável sucessor ter, ao menos, parte do crédito. Em contraposição, se um sucessor desse continuidade à realização de um projeto eficaz iniciado pelo seu antecessor e, assim, obtivesse resultados positivos, confirmaria os méritos do “inimigo” político-partidário. Sabe-se que as medidas efetivas para a mudança da atual realidade sócio-criminal, ainda que implementadas com todo o vigor, levarão um bom tempo até que comecem a surtir resultados sensíveis, e o que é pior: medidas a longo e a médio prazos não dão votos. Não obstante, a situação atual tem conseguido fazer com que a criminalidade seja um assunto muito discutido nas eleições, rendendo votos - o que é importante - e a conseqüente conquista do pleito. Logicamente, o combate à criminalidade é um objetivo e um interesse totalmente legítimo, mas como ele tem sido planejado e executado deixa dúvidas. Combate à criminalidade difere muito do combate ao criminoso, muito mais ainda do combate aos produtos e objetos do crime. Constata-se, então, que o povo tem sido vítima do seu próprio senso de responsabilidade e consciência política, não só dos bandidos. E o que falar das favelas, que crescem desordenadamente em uma progressão espantosa? O poder público tem mesmo fechado os olhos para esta realidade? Pois é, afinal, o povo desamparado, mal instruído e miserável vota por qualquer promessa, por qualquer recompensa ou pelo menor favorecimento. Em favelas do Estado do Rio, ainda se vêem placas nas entradas com nomes de políticos: os pais daquela realidade, mantidos no poder por aquele povo eternamente enganado. Ora, por óbvio, importa também é que se esteja sempre em estado de crise, pois assim, em seus discursos, tais políticos só precisam falar mal do atual governo para conquistarem mais alguns milhares de votos indignados.

III. Mídia X comunicação social

Recentemente, campanhas promovidas por entidades e empresas de comunicação vinham tentando colaborar com os políticos, colocando a culpa da criminalidade nas armas de fogo e até nas de brinquedo, retirando-se o foco do real problema social, que, além de provocado, tem sido enfrentado de maneira totalmente ineficaz pelos governos. Será que já não perceberam que as medidas adotadas na atualidade são a continuidade de um círculo vicioso que não modifica em nada o trato do problema em questão desde a Idade Média? Como um pequeno exemplo, o valor gasto com a manutenção do sistema penal e com a retirada de armas velhas, obsoletas e/ou ineficazes das mãos da população ordeira talvez poderia ter sido melhor utilizado na produção de dignidade, bem-estar etc., pois, basicamente, o custo de cada segregado para os cofres públicos pagaria pelo sustento de sua família e incentivaria sua atividade produtiva. O aumento das penas, gastos com viaturas novas, admissão de policiais aos trancos e barrancos através dos famosos concursos “bumba meu boi”, armamento modernizado, delegacias informatizadas e remodeladas não derivam de medidas concernentes à efetiva prevenção criminal. Quando muito, conseguem dissuadir o infrator potencial e diminuir o surto de pavor provocado na sociedade com as sempre recentes tragédias diárias. Não passa de propaganda política. Neste caso, é importante também aprender a não confundir prevenção criminal com segurança pública.
Oportuno reportar-se ao que leciona Antonio Garcia-Pablos de Molina, asseverando que a prevenção criminal é mais ampla e distinta das medidas que visam dificultar o cometimento de crimes, ou dissuadir o infrator potencial ameaçando-o de castigo - cada vez maior -, de forma que, somente intervindo nas raízes e causas do fenômeno criminal é que se produzirão resultados mais satisfatórios. As referidas raízes e causas já são bem conhecidas: a cultura social, a ausência total de controle populacional, a decorrente falta de emprego, a má distribuição de renda, a falta de políticas públicas legítimas para melhoria nas áreas da educação, saúde, habitação, lazer etc. Ressalte-se que os pobres e os mal instruídos também são eleitores e, por serem maioria, devem ser “agradados” (mantidos) para que possam também manter os que estão na política. Acabar com a miséria e com a ignorância seria acabar com os eleitores dessa atual política, que parece ter como lema: "Dê o peixe, mas nunca os ensine a pescar” (Educação) - O Brasil tem fome? Dê comida... (Fome Zero). Influenciar na opinião e no modo de ser das pessoas – “crentes na vida transhistórica, descrentes do mundo, apaixonadas pela mídia etc.” – é tarefa árdua e complexa, porém necessária se quiserem efetuar significativas modificações rumo à paz social e ao bem querer comum. Realmente, isso é tarefa para quem estiver disposto a fazer uma longa incursão em torno das questões antropológicas, sociológicas, etnológicas etc., utilizando-se de meios que possam atingir o maior número de indivíduos, sejam eles de qual classe forem. Destarte, reconhece-se que seja impossível estabelecer paradigmas na ordem do humano - como leciona o insigne prof. Aquiles Côrtes Guimarães, asseverando serem as vontades incontroláveis, entendendo-se o exercício do poder somente na incontrolabilidade das vontades, embora todas essas se manifestem nos atos de eleição dos seus representantes. Quem sabe, um dia, os meios de comunicação não deixarão de induzir e apoiar o anacronismo das viciadas medidas políticas, passando à conscientização desinteressada? Atentando e provocando sensivelmente o corpo social, talvez ele mesmo inicie aos poucos a promoção de verdadeiras mudanças em seu seio, contribuindo com melhores candidatos, exercendo com virtude a cidadania e a Democracia. Complementa-se o argumento acima lembrando que: “quem detém a comunicação, detém o poder”, pois: "Se é a comunicação que constrói a realidade, quem detém a construção dessa realidade detém também o poder sobre a existência das coisas, sobre a difusão das idéias, sobre a criação da opinião pública" (Pedrinho A. Guareschi). Porém, com o exposto e diante do conteúdo disponível na mídia, nota-se que a função social dos meios de comunicação encontra-se totalmente desvirtuada, pois, como se tem constatado, a má atuação desses meios na criação, transmissão, mudança, legitimação e reprodução cultural, através da veiculação de cada filme, novela, programas, propaganda, campanhas etc., está levando a sociedade a se conduzir de modo totalmente inconveniente, rumo a um progresso direcionado às incertezas e à dor. Antes de se dizer não à censura, deve-se dizer SIM à Comunicação SOCIAL!

IV. Conclusão X utopia

Portanto, parece que soluções políticas legítimas, apoiadas de maneira desinteressada pelos meios de comunicação, ainda que importem em sacrifícios para cada indivíduo, se tornariam totalmente viáveis e eficazes, às custas do tempo e das mudanças culturais. Deixaria o povo de viver como vítima de uma oligarquia mal caráter ou de uma democracia demagógica, para serem cidadãos de um Estado Democrático de Direito, que ainda não se conhece como se prega. Mas, ainda que se esteja tentando contribuir com uma opinião bem intencionada, finaliza-se com a pergunta: "Qual o peso social na formação da consciência coletiva que existe entre um apresentador de TV e o peso social na formação da consciência coletiva do mais renomado pesquisador?"

por Fabio Geraldo Veloso – Niterói/RJ

1 MOLINA, Antonio Garcia-Pablos de. Criminologia: introdução a seus fundamentos teóricos. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2002. p. 398.
2 GUIMARÃES, Aquiles Côrtes. Pequena introdução à filosofia política. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000. p. 03.
3 GUARESCHI, Pedrinho A. (org.). Comunicação e controle social. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. p. 15.
4 PEGORARO, José. A incomunicação na sociedade eletrônica em: Comunicação e missão da igreja, São Paulo: Paulinas, 1989. p. 18.

Um comentário:

Fabio Geraldo Veloso disse...

ALUNOS DE CRIMINOLOGIA DO PROF. FABIO G. VELOSO: OS COMENTÁRIOS A ESTE ARTIGO SERÃO VÁLIDOS COMO CARGA HORÁRIA DE T.D.E.